Romance inédito “Vemo-nos em agosto” foi publicado esta quarta-feira em todo o mundo, Portugal incluído, no dia em que se assinala o 97.º aniversário do escritor colombiano.
FOTO: AFP |
Durante anos a fio, indiferente ao progressivo avanço da doença que o
vitimou, Gabriel García Márquez trabalhou de forma quase secreta num novo
livro, cuja existência só foi tornada pública já depois da sua morte. O seu
amigo José Saramago foi um dos primeiros a ter conhecimento do projeto no final
da década de 1990.
É esse muito esperado livro, “Vemo-nos em agosto”, que esta quarta-feira
chega às livrarias de mais de 30 países, Portugal incluído, no dia em que se
assinala o 97.º aniversário do escritor e a poucas semanas do décimo
aniversário do seu falecimento.
“É um texto absolutamente consistente com o mundo narrativo que García
Márquez foi construindo na sua obra”, defendeu esta terça-feira Pilar Reyes,
diretora editorial da Penguin Random House, durante uma conferência de imprensa
no Instituto Cervantes, em Madrid, a que assistiram, presencialmente ou por via
remota, duas centenas de jornalistas de todo o mundo.
Márquez não queria editar o livro
Mais dúvidas sobre a qualidade do livro a que se dedicou nos últimos anos
de vida tinha o próprio autor, que, segundo confidenciaram os filhos, Rodrigo e
Gonçalo García Barcha, manifestou a vontade de que a história não chegasse aos
leitores.
Um desejo que, após uma prolongada reflexão, os seus descendentes optaram
por não cumprir.
“Quando o pai transmitiu essa opinião, já tinha perdido a capacidade de
julgar. Por norma, ele destruía tudo quanto achava que não devia ser publicado.
Não foi o caso de ‘Vemo-nos em agosto’. Achámos, por isso, que valia a pena ser
publicado, mas os leitores dirão de sua justiça”, afirmou, a partir dos Estados
Unidos, Rodrigo García.
O receio de que o texto pudesse ser publicado à revelia dos familiares e
“contribuísse para a pirataria” também pesou na decisão.
Contar para viver
Com uma tiragem inicial de 250 mil exemplares em língua espanhola, a nova
novela segue os passos da brevidade de “Memórias das minha putas tristes”. Mais
do que uma opção estética, este laconismo foi uma forma de contrariar as
dificuldades físicas que enfrentou na última década e meia de vida, com sinais
crescentes de perda de memória.
“Não se tratava de viver para contá-la, como intitulou a sua autobiografia,
mas de contar para viver. A escrita era fundamental para si”, destacou a
editora.
Havia cinco versões
Nos arquivos do escritor, os familiares encontraram cinco versões dos
manuscritos, que serviram de base integral para a edição agora lançada.
A reescrita permanente era uma constante no processo criativo do
romancista, sempre em busca do aperfeiçoamento narrativo. Mas, neste
particular, “Vemo-nos em agosto” até fica muito aquém da maioria das suas
anteriores obras - a anterior novela do autor de “Cem anos de solidão” teve 18
versões.
Por isso, Rodrigo García admite que o livro “não está tão polido como nos
seus principais romances”, mas, ainda assim, apresenta muitos dos atributos
associados a Gabo.
“A prosa é preciosa e o grau de conhecimento do ser humanos é muito
elevado”, concluiu Rodrigo García.
Novela sobre o desejo feminino
Fogosas ou discretas, as mulheres são uma das traves mestras do universo
literário de Gabriel García Márquez , mas poucas têm honras de personagens
centrais.
Para essa galeria restrita entra agora Ana Magdalena Bach, a protagonista
de “Vemo-nos em agosto” que, todos os anos, na mesma data, cumpre um ritual
específico: depositar flores na campa da mãe. É também nessa ocasião que a por
norma recatada esposa e mãe exibe uma faceta que lhe está vedada no dia a dia,
ao arranjar um novo amante que lhe permite “viajar mais longe para o interior
do seu desejo e do medo escondido no seu coração”. Fonte: JN
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