Exames em formato digital estão a deixar alunos e professores preocupados. Foto: Maria João Gala/Global Imagens |
"Se houvesse tempo para voltar ao papel, valeria a pena dar um passo atrás de forma a garantir a equidade entre os alunos”. A afirmação é de Filinto Lima, presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas (ANDAEP), apreensivo com a aplicação dos exames nacionais de 9.º ano em formato digital. Para o também diretor do Agrupamento de Escolas Dr. Costa Matos, Gaia, alguns estudantes irão partir em desvantagem para as avaliações finais de Português e Matemática. “Alguns têm computador desde o início do ano e estão a treinar diariamente e outros ainda não têm PC. Esses, estão tecnicamente menos preparados em relação aos colegas”, explica.
Perante o quadro de indefinição política e ainda sem conhecer o próximo ministro da Educação, Filinto Lima pede “a quem venha a assumir a pasta que resolva os problemas existentes antes dos exames”. “Cada dia que passa a preocupação aumenta porque ainda não há solução para este problema. Acaba por ser um fator acrescido de stress para os alunos e muitos precisam de ter sucesso nos exames para passar de ano. É preciso não esquecer que as provas de 9.º ano não são provas de aferição e têm ponderação na avaliação final das disciplinas”, sublinha.
O presidente da ANDAEP coloca três cenários em
cima da mesa: “arriscar, avançado com os exames digitais, adiar a sua aplicação
ou regressar ao papel e à caneta”. Contudo, frisa, “é necessário saber se há
tempo útil para que se possa voltar ao formato tradicional, tendo em conta que
estamos a cerca de três meses dos exames”. Por isso, afirma, “uma das primeiras
decisões do próximo ministro ou ministra da Educação deve ser encontrar uma
solução para esse problema”.
Já sobre as provas de aferição do 2.º, 5.º e
8.º ano, Filinto Lima, confessa não ter tantos receios, pois “não têm
ponderação na nota final dos alunos”. “Essas até poderiam não ser feitas que
viria nenhum mal ao mundo”, conclui.
“Não estão
garantidas as condições para a aplicação dos exames ”
Arlindo Ferreira, diretor do agrupamento de Escolas Cego do Maio e autor do
blogue ArLindo (um dos mais lidos no setor da Educação), partilha os mesmos
receios e antevê muitos problemas. “Não estão garantidas as condições para a
aplicação dos exames em formato digital”, garante ao DN. No topo das
preocupações do diretor do agrupamento de Escolas Cego do Maio, onde faltam 60
computadores, está a prova de Matemática, por ser “a mais complexa para ser
feita sem treino de forma digital”. Arlindo Ferreira admite poder “remediar” a
situação com as novas orientações do Ministério da Educação (ME), embora afirme
não serem suficientes para fazer face ao problema. Recorde-se que o concurso
para reparar portáteis das escolas não teve interessados. O ME lançou, entretanto,
outro concurso. “Já enviamos o novo ficheiro de necessidades ao ME e pudemos
alterar o tipo de PC. A título de exemplo, um computador de tipo 1 só podia ser
entregue a alunos do 1.º ciclo. Agora, vamos poder alocá-los a alunos de outros
ciclos que precisem deles para fazer as provas”, explica Arlindo Ferreira.
Essas novas diretivas levarão, contudo, a que alguns alunos tenham de entregar
o computador que está na sua posse. À falta de computadores, junta-se ainda a
preocupação dos bloqueios dos equipamentos. “Os computadores são bloqueados
pelo sistema quando não se ligam durante algum tempo. Temo que, no dia das
provas, muitos alunos tenham o PC bloqueado pelo sistema de segurança”, revela
Arlindo Ferreira. O diretor do agrupamento de Escolas Cego do Maio avança que
esta situação é do conhecimento do ME.
O DN pediu um esclarecimento ao ME para saber o que está a ser feito para resolver a falta de computadores e as avarias dos equipamentos, mas até à hora do fecho desta edição, não recebeu qualquer resposta.
Professores de Matemática querem cancelamento.
Sandra Nobre, da Associação de Professores de
Matemática (APM), responsável pela pasta dos exames de 9.º ano, defende o
cancelamento dos exames em suporte digital e pretende um “trabalho sério e
seguro antes de avançar para o online”. “A minha posição é que não deveria
haver provas em formato digital. Em muitas escolas não correu nada bem. A
plataforma que é usada não está livre a 100 por cento para os professores a
poderem usar e testar com os alunos antes dos exames”, explica. Para a docente,
a plataforma deveria ser disponibilizada com antecedência, de forma a poder
testá-la de forma consistente com os estudantes antes dos exames. A disciplina
de Matemática, sublinha, “tem uma escrita com caracteres específicos e não é
fácil recorrer ao PC”. “No dia do exame, os alunos deveriam estar preocupados
com as respostas e não à procura das teclas para esses caracteres, como a raiz
quadrada, por exemplo”, sustenta.
Segundo Sandra Nobre, no caso da Matemática há
outra grande desvantagem na realização das provas em suporte digital: “Os
alunos não conseguem ver o anunciado enquanto estão a resolver as questões”.
Todos estes fatores, aliados ao “mau funcionamento da internet e aos bloqueios
da aplicação” – problemas que marcaram a realização dos exames no ano letivo
anterior – deixam Sandra Nobre apreensiva e com a certeza de que o papel e a
caneta são a melhor solução para os alunos.@ DN
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