Um artigo da médica Francisca Sá, neurologista na Unidade Local de Saúde Lisboa Ocidental – Hospital Egas Moniz.
Apesar de estarmos na era da informação, são ainda muitos os mitos que sobrevivem e alimentam o estigma associado à epilepsia. Alguns mitos surgem pela variabilidade de apresentações da doença. Na verdade, a epilepsia pode ser, em si, uma doença, ou ser uma manifestação clínica de outras doenças. E as manifestações clínicas são também elas variadas, dependendo se todo o cérebro é rapidamente envolvido na crise ou se apenas uma porção do cérebro é disfuncional. Apesar de as convulsões serem a forma mais reconhecível de crises epiléticas, nem todos os doentes com epilepsia têm, ou tiveram, este tipo de crises.
Um dos grandes mitos à volta desta doença é que todos os doentes com epilepsia têm convulsões. No entanto, o facto é que as crises epiléticas, dependendo da área cerebral envolvida, podem apresentar-se como alucinações visuais, movimentos involuntários, ou até sintomas psíquicos como sensação de déjà-vu. Os doentes podem recordar tudo o que acontece durante a crise, ou não ter qualquer memória para o sucedido. Uma outra crença que não passa de um mito é que ter uma convulsão significa ter epilepsia, quando na verdade os factos apontam que a epilepsia é uma doença crónica em que o cérebro gera crises epiléticas de forma não provocada. No contexto de insultos agudos, como por exemplo, baixa de sódio ou de glucose, pode ocorrer uma convulsão. Mas depois de resolvido o insulto, as crises ficam resolvidas e o diagnóstico de epilepsia não pode ser feito. Por isso, nem sempre a ocorrência de convulsões implica o diagnóstico de epilepsia.
Existem muitas crenças mitificadas em relação à epilepsia, como por exemplo, pensar que a epilepsia é uma doença das crianças, mas o facto é que a epilepsia pode surgir em qualquer altura da vida. Existem dois períodos em que é mais provável a sua ocorrência, na infância e na terceira idade. As causas da epilepsia são diferentes nas diferentes faixas etárias, sendo as causas genéticas e malformativas mais frequentes em idades mais jovens, e a doença cerebrovascular, tumores e traumatismos mais prevalentes em idades avançadas.
A associação da epilepsia a dificuldades cognitivas é também um mito. Os doentes com epilepsia são perfeitamente capazes de exercer as suas profissões, nas mais diversas áreas. Cerca de dois terços dos doentes com epilepsia têm as suas crises controladas com a toma de medicação.
Os estímulos luminosos constituem outro mito, que pode limitar a vida da pessoa com epilepsia. A ideia de que a exposição a luzes fortes ou intermitentes desencadeia crises nos doentes com epilepsia só é verdadeira para os doentes com fotossensibilidade. E, de facto, só cerca de 3% dos doentes com epilepsia têm crises desencadeadas por estímulos luminosos.
A ideia de que a prática desportiva ou a incapacidade da mulher em engravidar são também mitos, que condicionam a vida das pessoas com a epilepsia . Mas de facto, raramente o exercício físico desencadeia crises epiléticas. As mulheres com epilepsia podem engravidar, mas devem fazê-lo de forma planeada para adequar a terapêutica de forma a minimizar riscos para o bebé.
Existem ainda algumas ideias erradas sobre a melhor forma de atuar perante uma crise convulsiva. É um mito que deve colocar-se uma colher ou outro objeto na boca do doente durante a convulsão para não asfixiar com a língua. Na verdade Não deve ser colocado qualquer objeto na boca de um doente que esteja a ter uma convulsão. O objeto pode fragmentar-se e provocar sufocação. Deve sim, colocar-se o doente em posição lateral de segurança, para que a língua caía para a frente e não para trás, facilitando assim a respiração do doente e a recuperação da crise. Fonte: Sapo
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