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segunda-feira, 29 de março de 2021

pais, professores e alunos estão “esgotados”

Entre os mais novos houve alívio com o regresso à escola, mas "exaustão" é a palavra mais usada à entrada para a reta final de mais um ano letivo atípico. O testemunhos de pais, alunos e professores.

foto de Nelson Garrido

Quando, há pouco mais de duas semanas, o primeiro-ministro anunciou o plano de desconfinamento, havia dois pares de olhos especialmente atentos numa casa de Santa Maria da Feira. Os filhos de Hugo Paiva “saltaram” quando perceberam que podiam voltar à escola dali a poucos dias. “Ficaram realmente felizes”, conta o informático do Hospital de S. João, no Porto. As duas crianças estavam “fartas” de estar em casa.
Hugo Paiva tem dois filhos, uma rapariga do 4.º ano e um menino em idade pré-escolar, e estavam confinados há mais um mês do que a maioria dos colegas. A covid-19 atingiu a família antes do Natal e a alta só chegou no momento em que o Governo decidia voltar a fechar as escolas. Havia, por isso, “muitas saudades” da escola. Mas era sobretudo dos contactos sociais que as crianças sentiram mais falta, conta o pai.
Em termos de ensino, os últimos meses “foram mais consolidados” do que o primeiro confinamento. O contacto com professores e educadores passou de três horas e meia de videoconferência por semana para sessões de três horas por dia. “Houve continuidade de aprendizagens e os alunos não se sentem tão perdidos. Eles sentem-se quase tão bem como se estivessem na sala de aula”, explica este pai de Santa Maria da Feira. Fazem falta, no entanto, os amigos: “Eles queriam muito voltar a encontrá-los.”
O filho mais novo de Cláudio Gonzaga anda no 3.º ano e também voltou à escola, na Maia, a 15 de Março. O regresso ao ensino presencial “aliviou bastante” o dia-a-dia deste consultor de tecnologia. Tem outra filha, no 7.º ano, que se manteve em ensino à distância até ao final do 2.º período, na última sexta-feira.
Nos últimos meses, o quotidiano doméstico não passou apenas pelo acompanhamento das aulas à distância dos dois filhos, mas também pela gestão da “carga emocional”, que está a deixar marcas em ambas as crianças: “Há maior irritabilidade, por exemplo, e um excesso de euforia em pequenas coisas.” Sinais de um esgotamento que é comum à generalidade dos alunos.
A grande diferença do primeiro para o segundo confinamento, para Ana Paulo Lourenço, foi que a sua filha estava “muito menos motivada”. “Talvez já soubesse o que a esperava.”
Ana Paula Lourenço não é só mãe, é também professora no Colégio Vasco da Gama, em Sintra – dá aulas de Português e Inglês a alunos do 8.º e 9.º anos. Depois de mais dois meses de confinamento e ensino à distância está particularmente desgastada? A resposta sai com um suspiro: “Estou cansadérrima.”
“Estamos esgotados. É como se estivéssemos a trabalhar a dobrar”, avalia, por seu turno, Ester Leopoldo, professora de Português e História no 2.º e 3.º ciclos. A preparação das aulas à distância “é mais trabalhosa” do que no ensino presencial. Além disso, o feedback dos exercícios resolvidos nas aulas, que normalmente seria quase imediato em contexto presencial, agora exige um trabalho de correção em casa.
“A maioria das crianças e jovens não parou nesses 15 dias”, comenta a pedopsiquiatra Catarina Amaral. Em muitas escolas, sobretudo no setor privado, esse período foi de acompanhamento intensivo dos alunos. Houve também “muitos pais que, não sabendo bem o que fazer perante a situação, deram tarefas diárias aos filhos”, acrescenta a especialista. Portanto, os alunos “não descansaram nessa altura, ao mesmo tempo que ficaram sem período de férias”.
O período de confinamento e ensino à distância tem provocado uma “exacerbação de sintomas” nas crianças que Catarina Amaral já acompanhava nas suas consultas, com problemas de ansiedade, défice de atenção ou mesmo ansiedade. Além disso, a pedopsiquiatra começa a notar sintomas de burnout, sobretudo nos jovens do ensino secundário, que estão a preparar-se para o acesso ao ensino superior. “Estão preocupadíssimos com o que podem não ter aprendido”, expõe. “Estudam de manhã à noite, com uma dedicação extrema.”  @ PÚBLICO
E ainda há três meses de aulas pela frente. 

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