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sexta-feira, 14 de maio de 2021

que apatia é esta que andamos a sentir?

Os psicólogos alertam que pode ser uma emoção dominante em 2021.

Muitas pessoas têm sentido uma espécie de vazio, de apatia. Não estão doentes, mas também, claramente, não se sentem bem. Há um nome para isso na psicologia: “languishing”. Se se sente assim, não se culpabilize. Mas também não ignore os sinais. “Não é uma coisa que o tempo resolva”, alerta o psicólogo Tiago Pereira. É preciso sermos ativos para inverter o rumo — e evitar chegar a situações mais graves. A boa notícia é que há estratégias ao nosso alcance para isso.

Ao telefone, uma avó desabafa que se sente estranha. “Eu, que antes me entusiasmava tanto com o meu neto, agora parece que não consigo vibrar com o que ele faz e diz, com os momentos em que estamos juntos”. Do outro lado da linha, a amiga responde que sente exatamente o mesmo — uns dias antes, tinha ido meio apática para o aniversário do filho.

A diretora de uma empresa questiona-se: “Agora que chegaram as vacinas, que a pandemia parece estar mais controlada, não deveria estar a sentir-me melhor?”. Lembra-se de que há um ano estava cheia de energia a dar resposta aos desafios que surgiam a cada minuto. E agora sente-se amorfa, sem capacidade de se apaixonar pelos dias.

Os relatos vão-se multiplicando. As vidas que levamos desde que a covid-19 chegou são muito propícias à multiplicação destas situações.

Que sensação é esta que parece ser comum a tantas pessoas?

A palavra usada em inglês pela psicologia é languishing. Em português, não existe um equivalente óbvio. “Definhamento” é um termo pouco feliz (e nada técnico), mas pode ajudar a traduzir, de certa forma, a realidade.

“A pessoa não está deprimida, não tem uma perturbação psiquiátrica associada. É um princípio muito cíclico de nos irmos fechando, fechando, fechando…”, descreve ao SAPO24 Tiago Pereira, coordenador do gabinete de crise e membro da direção da Ordem dos Psicólogos Portugueses (OPP).

Num artigo publicado em 19 de abril deste ano no jornal New York Times, o famoso psicólogo norte-americano Adam Grant admite que esta possa bem ser “a emoção dominante em 2021”: “Uma sensação de estagnação e vazio. Parece que vamos deambulando pelos dias, a olhar para a vida através de um nevoeiro”.

Adam Grant chama ao languishing o “filho do meio da saúde mental”. “É o vazio entre a depressão e o flourishing. Não temos sintomas de doença mental, mas também não somos um exemplo de saúde mental. Não conseguimos funcionar na nossa capacidade plena”.

Flourishing quer objetivamente dizer a capacidade de cumprirmos o nosso potencial”, descreve o psicólogo Tiago Pereira. Acontece quando somos capazes de usar as nossas competências para “fruir a nossa vida”, "estabelecer propósitos", “cumprir objetivos”.

“O languishing é exatamente o contrário disto. Alguma coisa que, em vez de expandir, mirra”, continua o especialista. “Como quando um balão começa a perder o ar. Fica enrugado, mirrado”.

O conceito não nasceu com a pandemia — foi introduzido pelo sociólogo norte-americano Corey Keyes, na sequência de investigações realizadas nos anos 90 do século XX —, mas quem se tem sentido assim nos últimos meses reconhecerá os sintomas.

É aquela procrastinação, em que vamos “adiando as tarefas e vivendo esse adiar com uma espécie de culpa”, palavras de Tiago Pereira. Uma desmotivação que se entranha. A incapacidade de nos projetarmos no futuro — sim, não conseguir planear as férias ou fazer planos para as semanas seguintes contribui para que, a pouco e pouco, percamos a vontade de definir objetivos.

Com o perigo de, a dada altura, como diz Adam Grant, ficarmos “indiferentes à indiferença”. @Sapo

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