Alguns sintomas da COVID-19 podem persistir várias semanas ou meses depois da resolução da infeção pelo vírus SARS-CoV-2. Entre as sequelas mais predominantes, destacam-se as do foro respiratório e cardíaco e, por isso, a avaliação e monitorização médica é essencial no regresso seguro à prática desportiva. As conclusões são de um estudo de uma equipa multidisciplinar do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra (CHUC) e da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra (FMUC).
Uma equipa multidisciplinar composta por médicos de várias especialidades, incluindo docentes da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra (FMUC), publicaram na edição de maio de 2021 da Revista de Medicina Desportiva Informa um artigo sobre as sequelas da COVID-19 intitulado: "Sequelas da COVID-19 - Evidência Atual".
O artigo apresenta evidência científica atual acerca da relevância clínica das sequelas da COVID-19, com particular foco no foro cardíaco e respiratório aplicáveis à população geral. Apresenta também recomendações atuais de avaliação das sequelas em atletas profissionais, amadores e recreativos, e ainda indicações para o regresso seguro à prática desportiva.
Falámos com o médico e docente universitário Diogo Lino Moura, um dos autores do estudo.
Quais as principais sequelas a médio/longo prazo pós-infeção por SARS-CoV-2?
O início da pandemia COVID-19 data já de 2019, pelo que uma das preocupações atualmente não é só a fase da doença aguda e as suas consequências imediatas, mas também as eventuais sequelas a médio e a longo prazo, bem como o risco de cronicidade de alguns sintomas.
A COVID-19 é uma doença recente, antes totalmente desconhecida, pelo que não dispomos de qualquer informação prévia relativamente ao risco de sequelas da mesma. Encontramo-nos atualmente numa fase em que, pelo tempo já decorrido desde as primeiras infeções, começámos a conseguir reunir informação preliminar relativamente às suas sequelas numa fase inicial de um ano e poucos meses de evolução da doença.
À medida que o tempo decorre desde o início da pandemia, torna-se claro que alguns sintomas persistem após a resolução da infeção aguda. A evidência científica atual acerca da relevância clínica das sequelas da COVID-19 é ainda limitada, encontrando-se em plena investigação, mas a revisão permite destacar sobretudo sequelas do foro respiratório e do foro cardíaco. A doença intersticial pulmonar, a doença tromboembólica crónica com hipertensão pulmonar, a miocardite, as arritmias cardíacas, a insuficiência cardíaca aguda e as síndromes coronárias agudas surgem como as principais entidades referidas no pós-Covid.
Existe risco de cronicidade de alguns sintomas?
A evidência científica atual acerca da relevância clínica das sequelas da COVID-19 é limitada, encontrando-se ainda em plena investigação. Sabemos que ao fim de dois meses, 87,4% dos pacientes tem pelo menos um sintoma persistente, sendo os mais frequentes a astenia e a dispneia.
E nos casos de doença leve ou moderada?
Mesmo nos casos de COVID-19 ligeira, cerca de dois terços dos indivíduos mantêm pelo menos um sintoma ao fim de 60 dias, sendo a astenia um dos principais. Como referi, a revisão da literatura científica permite encontrar referência sobretudo a sequelas respiratórias e cardíacas. Ao analisar estas sequelas no pós-Covid verificamos que várias se tratam de doenças crónicas.
Quais as populações mais expostas a este risco?
A idade avançada e as múltiplas comorbilidades são fatores de risco para doença grave/crítica. Por sua vez, os sobreviventes de doença grave são os que demonstram sequelas respiratórias e cardíacas mais frequentes e com maior gravidade. Sendo assim, atualmente entende-se que o índice de gravidade da COVID-19 vai determinar a frequência e a gravidade das sequelas da mesma.
Qual o impacto desta doença em atletas de alto rendimento? Há já dados sobre isso?
A evidência científica atual acerca da relevância clínica das sequelas da COVID-19 é limitada. Se isto é verdade para a população geral, para os atletas de alta competição a evidência científica é ainda mais limitada. No entanto, tendo em conta que no grupo dos atletas a faixa etária é mais baixa e as comorbilidades menos frequentes, o impacto da COVID-19 a longo prazo antecipa-se como menor em relação à população geral.
No contexto de exercício intenso, vários atletas reportam sintomas persistentes (induzidos pelo esforço físico), nomeadamente tosse e dispneia, bem como fadiga crónica. Sendo assim, o desempenho desportivo do atleta de alta competição pode ficar condicionado mesmo na presença de sequelas ligeiras.
Que cuidados devem ser tidos em conta no regresso à prática desportiva após infeção?
A recomendação atual é a de que todos os atletas que tenham recuperado da infeção por SARS-CoV-2 sejam submetidos a avaliação clínica prévia ao regresso ao treino e competição, incluindo atletas que estiveram assintomáticos ou com sintomas ligeiros, sabendo-se que mesmo nos casos sem complicações poderá surgir sintomatologia induzida pelo exercício associada a lesão subclínica.
A fibrose pulmonar ou cardíaca decorrente da infeção, embora possam passar despercebidas pelo atleta, poderão ocasionar insuficiência cardíaca, arritmias malignas ou redução da função pulmonar, motivando sintomas súbitos induzidos pelo esforço físico, pelo que a investigação destas lesões é determinante para proteger os atletas. A identificação da miocardite deverá merecer especial atenção do clínico, uma vez que se trata de uma alteração frequentemente subdiagnosticada, podendo, contudo, associar-se a morte súbita. É importante que antes do retorno à atividade desportiva os atletas sejam capazes de realizar atividades de vida diária sem aparecimento de sintomas e consigam percorrer 500 metros a andar em superfície plana sem dispneia ou sensação de fadiga excessiva, aumentando progressivamente a intensidade do exercício e a sua duração, com progressiva inclusão dos exercícios de resistência muscular com baixo número de repetições. @ Sapo
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