Professor de matemática da Universidade de Lisboa alertou ainda para o descontrolo que pode acontecer se o Rt ficar acima de 1,2: “É quase garantido que poderá haver uma quarta vaga”.
“Se queremos ter a noção do efeito de abrir as escolas, é olhar para o que aconteceu ao Rt” em Setembro quando estas abriram, respondeu o especialista aos deputados. “Seis dias depois da abertura das escolas o Rt começou a subir e passados mais 15 dias tinha subido 20 a 25%. Se pensarmos que vai acontecer a mesma coisa, o que temos fazer é uma conta relativamente simples: Estamos com um Rt suficiente para que acrescentando mais 20% continuemos abaixo de 1 ou não?”, explicou Jorge Buescu.
A resposta foi também simples. “Se o Rt antes de abrirmos as escolas
estiver 0,98 diria que é mais do que imprudência, é quase procurar problemas
sérios, correr um risco muito grande de uma nova vaga”, disse Jorge Buescu,
dando como exemplo o que aconteceu por altura do Natal em que o Rt estava neste
valor e acabou por subir com o desconfinamento dado nessa altura. E um Rt acima
de 1, referiram os quatro matemáticos, é ter “um aumento exponencial de casos”.
“Aquilo que experiência nos tem mostrado é que o Rt é um indicador
essencial e deve ser tomado como sinal de alarme imediato a partir do momento
que atinge 1.1. Uma lição que podemos tirar para os próximos tempos, se
tivermos de começar a desconfinar, é que teremos de fazer um índice de risco.
Um Rt de 1,1 é um sinal de grande perigo e acima 1,2 é quase garantido que
poderá haver uma quarta vaga”, disse o professor da Universidade de Lisboa.
Explicou ainda que a análise diária do Rt, ainda que menos fina,
permite perceber que evolução da incidência se pode esperar ao final de dez a
15 dias. E fazer baixar o Rt leva tempo. Explicou que, com as medidas
gradualistas tomadas no início do ano, este indicador levou cerca de mês e meio
a descer. Já após
o fecho das escolas, o Rt desceu a menos de 1.
Henrique Oliveira, professor de matemática do Instituto Superior
Técnico, referiu que nas escolas “grande parte transmissão é feita através de
[doentes] assintomáticos ou sintomáticos antes dos sintomas [se manifestarem]”
e que esta transmissão é “o grande perigo da doença”. “É muito difícil combater
a pandemia por causa
dos assintomáticos.”
“Quanto mais jovem, mais se está no estado assintomáticos ou com poucos
sintomas. As escolas servem para transmitir a doentes de agregado familiar para
agregado familiar”, alertou o especialista, fazendo ainda referência ao
desporto escolar que realizado “sem máscara permite maior transmissibilidade”.
“Temos de ser cuidado nesta questão. Tem de ser feito ao ar livre e com
distância. Em ambiente fechado existe muita transmissão assintomática”,
reforçou Henrique Oliveira.
Análise do risco
Já Carlos Antunes, também professor da Universidade de Lisboa e elemento da equipa do epidemiologista Manuel Carmo Gomes, mostrou a análise da incidência que fez por faixas etárias para dizer que no final do ano passado a taxa de incidência dos grupos 6-12 anos e 13-17 anos “crescia na ordem dos 6% ao dia” e que a 22 de Fevereiro eram os grupos que mais desceram na taxa de incidência. Segundo o especialista, houve “uma redução drástica a 31 de Janeiro que tem a ver com algo que aconteceu nos dias 21 a 23”, já que “a transmissibilidade dá-se antes do inicio sintomas”, data pela qual faz a análise.(...)
Também Henrique Oliveira focou esse ponto, ao dar exemplo do que
aconteceu na terceira vaga. “As hospitalizações gerais sobem muito, mas os
cuidados intensivos não conseguem ir atrás. O número de óbitos dispara não só
porque os cuidados
intensivos não conseguem tratar bem quando estão no extremo da capacidade,
mas porque nem todas as pessoas conseguem entrar nos cuidados intensivos”,
explicou, referindo que Portugal é o sexto país da Europa com maior número de
óbitos por milhão de habitantes.
“À medida que as unidades de saúde escalaram a resposta, a
letalidade começa a descer. É quando se reconvertem enfermarias, se abrem camas
e hospitais de campanha”, acrescentou o especialista, que estima que seja
preciso 77,8% das pessoas imunizadas para o país ter imunidade de grupo, que
será conseguida
com a vacinação e com as pessoas que já tiveram a infecção. “Estimo
que pode haver quase triplo de casos relativamente aos casos conhecidos”,
disse.
Rastreios e testagem
Para João Seixas, também professor do Instituto Superior
Técnico, “há um problema essencial que é a testagem e rastreamento”. “Para um
rastreamento correcto é preciso fazer o seguimento e ter nexo causal. Um dos
graves problemas é que perdemos em determinado momento o nexo causal. Agora que
temos menos casos, é mais fácil. Mas chamo a atenção que será preciso colocar
em cima de mesa uma forma de rastreamento mais automática. Em alguma altura
será impossível, com o número de rastreadores que houver, fazer um rastreamento
até ao fim”, alertou.
Em relação à política de testagem, “alguma coisa tem de mudar”, já que a taxa de positividade e o número de casos estão “excessivamente correlacionados”. @ Público
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