No Dia Internacional da Mulher, é muito importante recordar e sugerir a leitura (ou releitura) do livro "Novas Cartas Portuguesas".
Escrito a três mãos - Maria Isabel Barreno, Maria Teresa Horta e Maria Velho da Costa - e sob o compromisso de nunca revelarem a autoria individual dos 120 textos, "Novas Cartas Portuguesas" contesta o poder e a ordem patriarcal, ao mesmo tempo que denuncia a condição das mulheres. A organização dos textos foi feita por Ana Luísa Amaral.
A obra de Maria Isabel Barreno, Maria Teresa Horta e Maria Velho da Costa, que foi editada em abril de 1972 pela Estúdios Cor, aborda também a guerra colonial e o sistema judicial, tendo sido proibida pela censura, que a catalogou como imoral e pornográfica. Na verdade, as três autoras e o editor, Romeu de Melo, foram acusados e levados a tribunal. (por Daniela Filipe @ NaoM)
Agora, em edição anotada, é possível constatar como três nomes da nossa literatura, num tempo "fechado" mas desejoso de abertura. "construíram" um livro carregado de "poesia". Uma "poesia" que dá força à mulher para lutar contra os valores patriarcais da sociedade portuguesa. Uma "poesia" que nos dá a conhecer as injustiças familiares, políticas e religiosas... Esta é uma obra que contextualiza no tempo, mas que nos confere a certeza que há injustiças que perduram para além dos tempos. Uma leitura obrigatória. (Vítor Tomás)
As "Novas Cartas Portuguesas" revolucionaram a sociedade nacional, ao utilizar uma linguagem aberta e sem censura, ao escrever sobre a sexualidade e ao analisar esta sexualidade do ponto de vista das mulheres. O livro tratou-se de um momento histórico na literatura portuguesa e na história dos feminismos e da luta pelos direitos das mulheres. Foi escrito em tempos de ditadura, num tempo em que as mulheres estavam relegadas ao espaço casa, que não tinham participação política, formação universitária generalizada, ou seja, numa época em que as mulheres não viam os seus direitos concretizado e em que a violência dos homens sobre as mulheres era natural e até legalmente possível em determinadas situações. Neste percurso as autoras lograram enfrentar a sociedade e o Estado, escrevendo sobre a mulher, os seus direitos, a opressão, a violência e a igualdade. Entre textos de uma riqueza literária avassaladora, conseguiram verter uma feroz crítica ao tratamento das mulheres pelos outros e pela lei. Por este motivo foram levadas a julgamento, acusadas de atentado ao pudor e à moral. Perante a notícia do julgamento as três autoras receberam o apoio internacional de várias pessoas (incluindo Simone de Beauvoir) e organizações, pelo que se pode afirmar ter-se tratado da primeira causa feminista à escala global em Portugal. As três Marias como continuam hoje a ser conhecidas, acabaram absolvidas em Tribunal mas apenas e só porque a sentença foi lida poucos meses após o 25 de Abril de 1974. O livro tem pré-prefácio e prefácio escritos por Maria de Lurdes Pintassilgo, que foi Primeira Ministra de Portugal. Nestas introduções à obra, Maria de Lurdes Pintassilgo refere que a obra despretenciosamente consegue direcionar-se a todas as mulheres por cingir a opressão e a violência ao domínio privado do corpo de cada uma, quase que numa perspetiva pós-moderna dos feminismos e da luta pela igualdade. No fundo, as autoras abraçam a fórmula de Foucault do corpo como último irredutível. A obra é indispensável não apenas por se tratar do mais importante livro feminista, mas também por nos dar uma clara visão da opressão sobre as mulheres e da violência a que estavam votadas e estar escrita num estilo literário absolutamente imperdível para os amantes da leitura. (Rute Almeida)
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