Tem visto professores e educadores à porta das escolas no primeiro tempo da manhã? Estão a mostrar à comunidade escolar que estão em luta pelo Seu futuro e pelo futuro da Escola.
O segundo período do ano letivo de 2022/2023 começa como terminou o primeiro, envolto num clima de contestação, com greves, protestos e vigílias. Mas afinal o que está a provocar tanta insatisfação por parte dos professores?
Os professores vão continuar, ao longo deste mês, com a greve por tempo indeterminado, convocada pelo Sindicato de Todos os Profissionais da Educação (S.T.O.P). O pessoal não-docente junta-se a essas paralisações a partir do dia 4. Três dias depois (sábado, 7) os docentes vão concentrar-se em frente às câmaras municipais de todas as capitais de distrito. Já a 14 de janeiro terá lugar, em Lisboa, uma "marcha nacional pela escola pública", estando já o S.T.O.P a mobilizar a comunidade educativa, professores, pessoal não-docente, alunos e encarregados de educação para marcar presença na capital. A FENPROF também está na luta e convocou greves por distrito, entre os dias 16 de janeiro e 8 de fevereiro. Entretanto, apelou aos professores para que "se mantenham unidos e lutem com o objetivo de derrotar as intenções do Ministério da Educação e valorizar a sua profissão". Pedido semelhante ao do coordenador do S.T.O.P, André Pestana, que promete não baixar os braços até que o ministro da Educação, João Costa, ceda às reivindicações dos professores.
Embora os docentes já estivessem descontentes com as condições da profissão, os protestos subiram de tom após o Ministério da Educação (ME) ter apresentado às estruturas sindicais propostas de alteração nos concursos, manifestando a intenção de se criarem procedimentos municipais de colocação de professores. Desta forma, a colocação e contratação de docentes passaria a ser feita por conselhos locais de diretores e em função dos perfis dos professores. Mudanças explicadas pelo ministro da Educação em conferência de imprensa, em novembro de 2022. Contudo, João Costa tem negado que estas mudanças se possam traduzir num processo de "municipalização" dos concursos de professores e tem acusado quem o afirma de estar a mentir.
O que está em causa?
Concursos
Os professores defendem uma gestão e recrutamento pela graduação do profissional, sem perfil ou mapas e sem gestão por parte dos municípios. O atual modelo de contratação seleciona os docentes a colocar apenas pelo critério da graduação profissional, que se obtém através da média de final de curso, sendo acrescido um valor à mesma a cada 365 dias de serviço.
Recuperação do tempo de serviço congelado
O tempo de serviço dos professores esteve congelado entre 2011 e 2017. Após um longo braço de ferro, o governo aceitou, em 2019, o descongelamento para efeitos de progressão na carreira de 70% do tempo. Estes 70% significaram a recuperação de dois anos, nove meses e 18 dias, um valor muito aquém dos cerca de nove anos e quatro meses que os docentes continuam a exigir.
Justiça na progressão na carreira e ajudas de custo para deslocados
Os professores progridem e sobem de escalão, vendo o vencimento aumentado, a cada quatro anos de serviço. Contudo, a progressão para os 5.º e 7.º escalões depende de vagas de acesso. Ou seja, mesmo tendo cumprido o tempo de serviço exigido, podem permanecer num escalão abaixo até à abertura de vagas. No caso dos contratados, enquanto não ingressarem nos quadros, não veem o seu vencimento alterado, levando-os a não conseguir fazer face às despesas se concorrem longe da área de residência. Pedem, por isso, um subsídio de alojamento e de deslocação para darem aulas em locais onde a falta de professores é maior, como nas regiões de Lisboa e do Algarve.
Atualização de vencimentos
Os sindicatos afetos ao setor pedem aumentos salariais que compensem a inflação. Segundo as plataformas sindicais, os docentes perderam mais de 20% do seu poder de compra desde 2009. Já os professores contratados estão sempre no 1.º escalão, independentemente do tempo de serviço que já tenham no ensino. O que significa, por exemplo, que um professor contratado com 20 anos de serviço recebe o mesmo que um recém-diplomado: cerca de 1100 euros líquidos.
Avaliação do Desempenho Docente (ADD) mais "justa"
A avaliação de Muito Bom ou Excelente é condição obrigatória para aceder aos 5.º e 7.º escalões, mas está limitada a um número máximo por escola. Há, por isso, quotas para o Excelente e o Muito Bom. Apenas 5% podem ter Excelente e 20% podem chegar ao Muito Bom. Isto é, em 20 professores, só um pode ter Excelente e quatro podem obter Muito Bom. Pode demorar dois anos para subir do 4.º para o 5.º e, no mínimo, três anos para aceder ao 7.º escalão.
Vinculação e estabilidade
Os professores contratados precisam de dar aulas três anos consecutivos e completos para poder efetivarem, ao abrigo da Norma Travão. Se num ano letivo, em vez das 22 horas correspondentes ao horário completo, ficarem com 21, terão de recomeçar o processo para "juntar" de novo os três anos. Outra forma de ingressar na carreira é através do concurso externo, mas o número de vagas varia de ano para ano e, segundo os sindicatos, não é suficiente face à necessidade que as escolas têm de contratação. Acresce ainda a instabilidade provocada pela colocação longe da área de residência. Há, por isso, professores contratados por décadas e muitos que efetivam com mais de 60 anos. Uma educadora de infância com 69 anos foi a candidata mais velha no concurso externo de professores para o ano letivo de 2022/2023.
Mais respeito pela figura do professor
Nas vigílias e manifestações, a classe docente tem pedido mais respeito pela figura do professor. Queixam-se de terem perdido autoridade e de serem desrespeitados por alunos e encarregados de educação. Todos os anos há milhares de casos. O S.T.O.P tem, no seu site oficial, um contador de agressões que não tem parado de crescer. Contudo, João Costa afirmou há três meses que "no registo de ocorrências da plataforma da segurança escolar, passamos de 1263 ocorrências em 2019/2020 para 698 no ano letivo passado".
Excesso de burocracia
Os docentes pedem menos trabalho burocrático e dizem que estão obrigados à realização de tarefas que poderiam ser feitas por outros profissionais. Há preenchimento de um elevado número de relatórios, grelhas de Excel e repetição de tarefas em plataformas digitais. Alegam que este excesso de burocracia lhes retira horas de trabalho, que deveriam ser canalizadas para trabalhar com os alunos e para preparar aulas. Cabe aos professores, por exemplo, tarefas como o preenchimento de documentos para que os alunos tenham acesso ao Cheque Dentista. Num estudo da Federação Nacional de Educação, 80% dos professores queixaram-se de trabalho burocrático "inútil". dnot@dn.pt
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