Apesar da sua antiguidade, ainda há muito a descobrir sobre os “sólidos platónicos”: cinco sólidos diferentes caracterizados por terem todos os lados iguais.
Em maio, um trio de matemáticos resolveu uma questão aparentemente simples sobre o dodecaedro, mas continuava sem resposta: imagine-se um dos vértices do dodecaedro, um sólido com doze faces e vinte vértices. Será que existe alguma linha direta que permita voltarmos à nossa posição original, sem passar por nenhum dos outros dezanove vértices?
Os três matemáticos,
Jayaved Athreya, David Aulicino e Patrick Hooper, mostraram no seu estudo, publicado no jornal Experimental
Mathematics, que há um número infinito destas linhas no dodecaedro,
contrariando a regra dos outros quatro sólidos platónicos, já que não existem
estas linhas no tetraedro, no cubo, no octaedro e no icosaedro.
No entanto, a
descoberta não foi fácil: foi necessário adotar técnicas modernas e algoritmos
de computador. De acordo com Anton Zorich, um matemático do Instituto de
Matemática de Jussieu, em Paris, “este processo seria impensável há vinte
anos”. Mesmo há dez anos, “requereria um enorme esforço para escrever todo o
softare necessário.”
O projeto de
investigação começou em 2016, quando Athreya e Aulicino estavam a montar
figuras geométricas com recortes de cartas. Enquanto montavam e desmontavam os
sólidos, tiveram a ideia de responder à pergunta que permanecia sem resposta
sobre o dodecaedro. Juntaram-se a Hooper e começaram uma pesquisa que viria a
durar quatro anos.
A tradução de superfícies
Os matemáticos já especulavam sobre estas linhas diretas no dodecaedro há mais de cem anos, mas o interesse por este tópico ressurgiu nos últimos anos, após serem feitas novas descobertas sobre a “tradução de superfícies”, uma técnica da geometria que se caracteriza pela formação de superfícies através da colagem dos lados paralelos de um polígono.
O resultado final da experiência foi uma
representação do dodecaedro com dez cópias de cada pentágono , que se assemelha
a “um donut com oitenta e um buracos”. Ao analisar esta enorme superfície, os
matemáticos chegaram à conclusão de que ela representava também uma das
traduções de superfícies mais estudadas por matemáticos – o “duplo pentágono”,
criada através da colagem de dois pentágonos.
Dado que o duplo pentágono e o
dodecaedro são “primos geométricos”, o alto nível de simetria do primeiro
ajudou a elucidar a estrutura do segundo. A relação entre estas superfícies
permitiu aos investigadores utilizarem um algoritmo de análise de superfícies
já existente. Através deste algoritmo, os especialistas identificaram e
classificaram todas as linhas diretas que permitem ir e voltar ao mesmo vértice
sem passar por outro vértice.
A exceção à regra
Este estudo provou que o dodecaedro é o
único sólido platónico em que é possível desenhar linhas diretas que saem de um
vértice e regressam ao mesmo, sem passar por outros vértices.
De acordo com Aulicino, esta exceção
justifica-se porque “há certas simetrias que o dodecaedro não tem, mas que os
outros sólidos têm.” Esta “falta de simetrias” é o que permite delinear estas
linhas diretas no dodecaedro e que impede os outros de as ter.
Os “sólidos platónicos” são estudados há
mais de dois mil anos. Platão associava cada um destes a um elemento natural –
o cubo com a terra, o octaedro com o ar, o icosaedro com água e o tetraedro com
o fogo. O quinto sólido – o dodecaedro – terá sido “utilizado pelos deuses para
formar as constelações do céu”, de acordo com o filósofo grego. Agora, depois
de 2380 anos, um trio de matemáticos voltou a garantir um estatuto especial ao
sólido geométrico. @Sapo
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