Os portugueses estão a poucas horas de conhecerem os pormenores de um Orçamento do Estado crítico para o futuro próximo do País, que está nas ruas há semanas, com informações e contra-informações e que, no mínimo, assusta os mais corajosos.
Os portugueses estão a poucas horas de conhecerem os pormenores de um Orçamento do Estado crítico para o futuro próximo do País, que está nas ruas há semanas, com informações e contra-informações e que, no mínimo, assusta os mais corajosos. Não só por uma austeridade que seria sempre necessária, por um enorme corte de despesa pré-anunciado, mas sobretudo porque o Governo dá sinais de desorientação, sem rumo e só com uma preocupação, a de cortar a eito, para responder à ‘troika' e aos mercados.
O episódio em torno das pensões de sobrevivência é um bom exemplo de uma má prática governativa, que esconde muito mais do que ‘apenas' uma má comunicação política. Antes fosse. Como é que é possível que o vice-primeiro-ministro interrompa um Conselho de Ministros de dezenas de horas para fazer uma conferência de imprensa sobre uma medida que vale 100 milhões de euros!? O défice de 2013, de 5,5% do PIB, vale cerca de nove mil milhões de euros.
Só há uma explicação possível: depois da fuga de informação para a TSF - que fez o seu trabalho, claro - a medida de 100 milhões valia muito mais, valia a reputação de um líder ‘irrevogável' do CDS que obrigou a ministra das Finanças a prestar-se, outra vez, ao papel de ‘ajudante', sem direito a palavra. Só para a comprometer politicamente. Ainda por cima, para anunciar uma decisão que não afecta praticamente ninguém, depois do caos de uma semana de incerteza para centenas de milhar de pensionistas. É neste ambiente dentro da coligação que se pressente uma desorientação política. Se não há desorientação, os ministros disfarçam muito bem.
O calendário acelerou, o tempo do Governo encurtou-se. Mas, no meio desta confusão, há um mérito: a discussão voltou a centrar-se na despesa pública, e esse é o problema, o excesso de despesa, e os cortes nos salários da função pública e nas pensões, porque consomem mais de 70% da despesa. Já está anunciado um outro corte, o das pensões da Caixa Geral de Aposentações, em média de 10%, mas não se sabe como é que vai ser articulado com outras decisões, uma decisão que vale 740 milhões de euros. E os cortes nos salários dos trabalhadores do Estado entre os 2,5% e os 12% a partir dos dois mil euros brutos de salários, esses, vão substituir uma nova tabela salarial na Função Pública prometida em Maio e que acabou numa gaveta, e não foi por causa do Tribunal Constitucional, para garantir pelo menos mais 500 milhões de euros.
É evidente que o Governo acabaria por chegar aos cortes de despesa, mas chega tarde, de rastos do ponto de vista político e no auge da conflitualidade social. E nem sequer consegue capitalizar as notícias de estabilização da economia, nem as poucas medidas de estímulo ao investimento, como a descida do IRC em dois pontos percentuais, que também constam do Orçamento do próximo ano.
O Governo, agora, não tem tempo, pode queixar-se da instabilidade causada por um colectivo de juízes do Tribunal Constitucional que decidiu proteger a falência do Estado a viabilizar uma saída para a crise financeira, mas deve queixar-se também de si próprio.
Se o primeiro-ministro falhar, é o Governo que falha, não é o País, o País sofrerá as consequências desse falhanço. Por isso se percebe a pressa. O Governo tem de convencer os credores, institucionais e privados, de que estará em condições de regressar aos mercados, de se financiar de forma autónoma, mesmo com a ‘rede' do BCE, a partir de meados do próximo ano. E isso é a principal preocupação do Orçamento do Estado que vamos conhecer hoje em detalhe. Portugal teria de ter, mesmo, um orçamento com corte de despesa, mas, agora, não é a qualidade da reforma do Estado, é a quantidade dos cortes, que têm mesmo de ser realizados, que está em causa. Se o Tribunal Constitucional deixar.
António Costa @ Económico
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