O direito ao contraditório
Os Professores, os Correctores dos exames, não podem ser compelidos a “aplicar” normas manifestamente inconstitucionais. @ PÚBLICO IVO MIGUEL BARROSO
Excelentíssimo Senhor Professor Doutor NUNO CRATO,
M.I.
Ministro da Educação,
1. O “Acordo Ortográfico” de 1990
(AO90) não é, em rigor, um “Acordo”,
uma vez que, internamente, não tem consistência ao nível da “unificação” da
ortografia, e, externamente, Angola e Moçambique não o ratificaram; não é “novo” (antes remonta aos
Projectos do AO86, que, por seu turno, remonta ao Projecto de AO75, começado a
ser preparado em 1971); e controversamente é “ortográfico”, devido às facultatividades
irrestritas que consagra e aos pressupostos metodológicos desactualizados em
que assenta (por exemplo, no que diz respeito à alegada aproximação da escrita
à fala, a pretensa primazia da oralidade, quando, ao invés, a ortografia não é
um conjunto de representações de sons; as “pronúncias”
contingentes (nem sequer, em rigor, correspondentes à “fonética”); as
discriminatórias “pronúncias
cultas da língua”).
2. O modo como o prazo de
transição foi antecipado pelo n.º 3 da Resolução do Conselho de Ministros n.º
8/2011 para todo o sistema de ensino padece de graves inconstitucionalidades
[1] (para o efeito, foi intentada uma acção judicial popular, por mais de 100
personalidades [2], para reposição e correcção de erros que o Governo teima em
não reconhecer).
O
AO90 é “um monumento de
incompetência e ignorância” [3], um experimentalismo social no
mínimo a-científico, executado sem quaisquer estudos prévios minimamente
credíveis sobre o respectivo impacto e, ao que tudo indica, só poderá dar maus
resultados.
Para
demonstrar a afirmação, basta notar dois factos, entre muitos outros:
1)
Os Pareceres, pedidos em 2005 pelo Instituto Camões, foram todos contra a
ratificação do 2.º Protocolo Modificativo, que viria a suceder em 2008; 2) um
ex-Presidente da Associação Portuguesa de Escritores e Livreiros, Administrador
e Director Editorial do Grupo Porto Editora, o principal Grupo económico que
está a imprimir os manuais escolares “acordizados”, foi sempre contra o AO90,
pelo menos até Março de 2011, quando cedeu, face à posição de o Estado mandar
implementar o AO90 no sistema de ensino a partir de Setembro desse ano de 2011
[4]).
3. O AO90, já de si, é mau
[5].
Mas
há pior: o Instituto de Linguística Teórica e Computacional (ILTEC), através do
conversor Lince e “Vocabulário
Ortográfico do Português”, e outros Linguistas em várias entidades
públicas (por exemplo, na Imprensa Nacional – Casa da Moeda, editora do “Diário da República”) têm “executado”
o AO90, com ampla redução das facultatividades permitidas.
Ora,
esta é uma violação ostensiva quer da letra das inúmeras Bases do Anexo I, quer
do espírito do Tratado do AO90, que prevêem facultatividades irrestritas. Os
instrumentos oficiais e privados têm suprimido, “a torto e a direito”, as
consoantes “c” e “p”; o que, ironia das
ironias, faz com que os laços com os Países de Língua Oficial Portuguesa,
incluindo o Brasil, sejam deslaçados, ficando Portugal com ortografia diferente
da ortografia do Brasil!
Por
outras palavras, a (alegada) “implementação” do AO90 desunifica a grafia
“acordizada” de Portugal relativamente à do Brasil (v. g., “perspetiva”,
por “perspectiva”).
Isto
tem uma agravante injustificável a todos os títulos, uma vez que cria, a partir
do nada, centenas de palavras novas, inexistentes nas ortografias do Brasil e
de Portugal (“conceção”,
por “concepção”;
“contraceção”, por
“contracepção”;
“anticoncetivo”,
por “anticonceptivo”;
“receção”, por “recepção”; “perceção”, por “percepção”; “confeção”, por “confecção”).
Outras
palavras têm dupla grafia no Brasil, sendo que as que têm consoantes
etimológicas são mais frequentes: “perspectiva”,
“respectivo”,
“aspecto”.
Ora, em Portugal, as consoantes “c” e “p” são cilindradas; com isso afastando a
ortografia portuguesa da ortografia maioritariamente praticada no Português do
Brasil.
O
caos ortográfico grassa nos vários dicionários, correctores e conversores no
que tange a outras regras arbitrárias e ilógicas, estranhas à nossa forma de
pensar, e fonologia, quase impossíveis de decorar.
IVO MIGUEL BARROSO
Sem comentários:
Enviar um comentário