sexta-feira, 5 de julho de 2024

50 anos ESÁS: "conta-me como foi..." (7)

No âmbito das comemorações dos 50 anos da ESÁS, o CRESCER continua a conversar com aqueles que por cá passaram, desde os fundadores até aos atuais alunos, funcionários e professores.

Sra. D. Rosa Barros
Desta vez a conversa foi com a
 Sra. D. Rosa Barros (a nossa cozinheira Rosinha, como todos carinhosamente a recordam), aposentada há 21 anos, que fez percurso e carreira na ESÁS desde 1975.

A D. Rosa chegou à escola, em Pedrouços, numa terça-feira, no dia 4 de novembro de 1975.

Como era trabalhar em Pedrouços?

Era bom, mas tinha de preparar mais de 300 almoços por dia, porque eram duas escolas. Estivemos lá onze anos, só depois é que viemos para aqui.

Essa veia de cozinheira, sempre a teve?

Vim dos Arcos de Valdevez para o Porto para ganhar a vida. Fiz um pouco de tudo. Fui mulher a dias, fui padeira (ai, que saudades!), trabalhei para um casal alemão no Porto. Trabalhei nas Antas, numa cafetaria, e lá fiz sucesso pois pediram-me para fazer uns salgadinhos para os finais da tarde, para os trabalhadores que ali iam, e eles adoraram.

Entretanto, concorreu para a escola. Como foi?

Soube que havia um concurso para cozinheira da escola e concorri. Fui lá entregar os documentos na secretaria, mas não podia ser aceite pois só tinha a terceira classe e exigiam o diploma da quarta classe.

Fiquei muito triste, mas na altura trabalhava a dias em casa de uma senhora, a D. Fátima (uma querida!), que era professora primária, contei-lhe, e ela preparou-me – num mês – para o exame final, na Maia. Trabalhei tanto!!! Até me doíam os olhos de ir para a cama ler, fazer contas, tudo o que precisava de saber. Mas consegui. Ainda fui a tempo de entregar o diploma da 4.ª classe para o concurso de cozinheira. E fiquei.

Entrei em novembro de 1975, mas a cantina só abriu em janeiro de 1976. Entrei eu como cozinheira (ver foto 2) e mais duas ajudantes, a D. Arminda e outra senhora.

foto 2

Lá estive onze anos, sempre a trabalhar naquele ritmo, mas depois de mudarmos para aqui (Corim) diminuíram os almoços. Passaram a ser 150 a 200 almoços. A D. Teresa Baía, do SASE, definia a ementa de segunda a sexta-feira. Eu cumpria.

Entrávamos às 8h30m, mas não tínhamos horas de saída. Eu tratava de distribuir o serviço. Umas descascavam batatas, outras cebolas, calculavam-se os quilos de arroz (uma média de 34 Kg/dia), a carne ou o peixe, os legumes, a fruta…. Preparavam-se as mesas e punham-se as canecas de água na mesa. Mais ao fim da manhã para não apanharem o pó vindo do polivalente, que eu cá gosto de tudo limpinho...

Os jovens gostavam de comer na cantina. Quando eu já tinha tudo distribuído dizia-lhes que podiam repetir e os que queriam iam buscar mais.

Com os professores acontecia o mesmo. Eles almoçavam numa mesa em frente ao balcão do self service, o conselho diretivo e outros. E havia muito professores a comer.

E que prato gostava mais de fazer?

O que eu gostava mais de fazer eram os assados, porque era o que todos mais gostavam. E rojões. E também de preparar os pratos dos mais pequenitos quando era peixinho. Tirava-lhes as espinhas para eles comerem sem medo. Por isso, a D. Teresa Baía dizia que eu era “muito humana”.

Com a autorização da Direção, dava a sopinha a alguns funcionários que tinham dificuldade em pagar, bem como a fruta que alguns alunos devolviam.

Em jeito de balanço, gaba-se de nunca ter mandado ninguém para o hospital, de ter sido sempre muita organizada e limpa e de todos a respeitarem muito.

foto 3
A D. Rosa tem dois filhos e três netos. A filha é professora, o filho é agente da polícia. Uma neta estuda Psicologia. A D. Rosa é natural de Arcos de Valdevez e fez o seu caminho a pulso. Na época da sua meninice as raparigas não iam à escola, por isso, fez a sua instrução entre os 11 e os 14 anos, quando Salazar mandou para as escolas as meninas que não tinham ainda 14 anos. Como tinha 11 anos, só fez a terceira classe, pois depois não era obrigatório que as meninas estudassem. Trabalhou desde muito cedo para ganhar a sua independência, em casas de gente mais abastada que lhe confiavam a chave, no Porto, na Maia e até em Lisboa. Com o marido, com quem está casada há 56 anos, que foi da guarda, agente da polícia (ver foto 3) e até sinaleiro no cruzamento da Areosa, cavalheiro poupado e comedido, soube amealhar e construir o seu “império”.

A D. Rosa é uma mulher de trabalho e de luta. Hoje, com 81 anos, continua a conduzir (tirou a carta com o seu dinheirinho em 1977) e está sempre pronta a ajudar e a colaborar.

A D. Rosa continua a gostar de cozinhar. Apesar de estar cansada, diz que continua a gostar de comer a sua comidinha e que, se pudesse, continuava a fazer os seus rissóis (inigualáveis!).

Quando convidada a recordar os presidentes dos conselhos diretivos, disse só se recordar bem do professor Ferreira e da equipa formada por ele: o professor Carlos Cardoso, a professora Maria Ana Pacheco e a professora Elisabete Almeida.

E como a conversa é como as cerejas, “atrás de uma vem outra”, a D. Rosa recordou que tinha trabalhado em casa dos pais da professora Elisabete, no Porto, era ainda a professora uma menina universitária namoradeira. Namorou e casou com um senhor de nome Fernando Almeida. E a D. Rosa gostava tanto dos nomes deles que deu esses nomes aos filhos: Elisabete e Fernando. Curiosamente, uma homenagem que, se calhar, nem a professora Elisabete conhece.

E que memórias guarda da escola?

Agora, passados estes anos, recorda ainda a professora Elisa Ferreira com saudade, com quem diz falar de vez em quando. Guarda com emoção a estrelinha que a professora Margarida Rebelo lhe ofereceu quando foi embora (ver foto 4) e que fez questão de trazer consigo.

foto 4

Também recorda as Ceias de Natal, que fazia com muito gosto e que só a libertavam por volta das duas horas da madrugada. No dia seguinte, comunicava ao Conselho Diretivo que havia sobras da ceia e aquecia-as para quem quisesse almoçar, bem como colocava as sobras dos doces no bufete para poderem acompanhar os cafezinhos.

Para finalizar e quando convidada a dizer o que gostaria ainda de fazer na escola, disse…

Gostaria de fazer uma ceia de despedida ao professor Ferreira. Se o Doutor Ferreira quiser, eu ainda vou fazer uns aperitivos para consolar a barriga aos mais antigos.


Sra. D. Rosa Barros, o CRESCER agradece a sua disponibilidade e o tempo concedido a esta tão bela conversa, deseja-lhe muita saúde e boa disposição para o tempo presente e para o tempo futuro e espera que continue a guardar no seu coração o amor que a escola lhe dedica.

texto de Manuela Couto, docente de Português
colaboração de Cândido Pereira, diretor do centro de formação maiatrofa

4 comentários:

  1. Que conversa tão doce!!

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  2. Muitos parabéns pelas suas palavras, D. Rosa. Provavelmente não se lembra de mim, mas eu lembro me bem das suas mãos de fada e o carinho que colocava nos pratos que servia.
    Muitas felicidades.

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  3. Muito obrigada, Sra. D. Rosa, pelo tempo que nos concedeu.
    Espero que tenha gostado de ler a nossa conversa e tenha gostado da manhã que a fez voltar à sua ESÁS.
    Saiba que para nós, mais provectos, será sempre uma referência da escola.
    Um beijinho

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  4. Histórias que nos aquecem a alma.

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