O futuro da escola em Portugal foi o tema do quarto de dez debates que a Imprensa e a Fundação Francisco Manuel dos Santos (FFMS) promovem desde maio. Até março, continuaremos a fazer um retrato das últimas cinco décadas de democracia em Portugal. Conheça as principais conclusões desta conversa.
As fragilidades do sistema de ensino português estão identificadas: faltam docentes, recursos e maior adequação dos currículos escolares. O diagnóstico é confirmado pelos especialistas que participaram no último debate “5 Décadas de Democracia”, transmitido na última terça-feira pela SIC Notícias. Foram eles a professora Maria Rosário Azevedo, do ensino secundário, Maria Azevedo, cofundadora do projeto Teach for Portugal, Joana Rato, neurocientista e psicóloga da educação, e Pedro Martins, professor na Universidade Nova de Lisboa. Estas são as principais conclusões da reflexão:
Recuperar a dignidade da carreira
“Precisamos de uma escola com professores e há desafios grandes a esse nível em Portugal”, enquadra Pedro Martins, que exemplifica com um dos dados que marcou o arranque deste ano-letivo: cerca de 80 mil alunos têm, pelo menos, um professor em falta;
Maria Rosário Azevedo, habituada às funções de docente e de gestora escolar, defende ser preciso melhorar as condições de trabalho daqueles que se dedicam ao ensino todos os dias. “Não conseguimos uma escola que faça os alunos felizes com professores-funcionários. É nisso que nos estamos a tornar”, considera. Em causa está o excesso de trabalho, mas também a falta de “respeito e confiança”. “O respeito passa pelas políticas do governo, mas também passa por uma sociedade que acredite nos seus professores, que não os ponha em causa”.
Eliminar as desigualdades sociais
A Teach for Portugal, organização não-governamental que se dedica ao combate da desigualdade educativa, recruta e forma profissionais de diferentes áreas que são colocados em escolas públicas em contextos desfavorecidos. “Trabalham em colaboração com professores com o objetivo de desenvolver competências académicas, mas também outras que os coloquem [aos alunos] no caminho de sucesso”, explica Maria Azevedo. A cofundadora pretende que “o código-postal de uma criança não limite aquilo que são as suas oportunidades”.
Nos últimos três anos, a instituição já colocou dezenas de mentores em estabelecimentos de ensino selecionados – normalmente com uma taxa elevada de alunos com ação social escolar e em que a taxa de escolarização das famílias é inferior – com resultados relevantes. “Esta colaboração [entre mentor e professor] permite melhorar os resultados dos alunos, como uma aceleração da redução das negativas. Conseguimos ver esse aumento em cerca de 30% a 35% em alunos do 2º ciclo”, esclarece.
Atualizar competências e currículo.
A neurocientista Joana Rato acredita que o país deve apostar na atualização de competências e do conhecimento, quer dos alunos, quer dos professores. Para a investigadora, as licenciaturas de educação básica devem ser revistas para dar lugar a novos dados científicos que permitam repensar, por exemplo, as questões ligadas ao tempo de atenção das crianças em sala de aula. “A preocupação é de perceber que a atenção não é inesgotável e que se fizermos uma mudança de registo os alunos conseguem acompanhar melhor”, diz.
Este é um tema particularmente importante em cenário de recuperação de aprendizagens no pós-pandemia. Maria Rosário Azevedo refere que “alguns alunos não conseguem perceber a pergunta que está à [sua] frente” ou que não conseguem “colocar o seu pensamento de forma clara no papel”. A resposta do sistema devia ser, reconhece, o acompanhamento personalizado dos alunos com mais dificuldades, mas não é fácil “chegar a todos” por falta de docentes.
Em matéria dos currículos oferecidos nas escolas, o investigador Pedro Martins pede “uma escola mais articulada com o mercado de trabalho” e com maior flexibilidade para adaptar a forma de ensino às necessidades reais das empresas. Aliar essa adequação a um “investimento na qualidade dos cursos” permitirá, antecipa, recuperar o retorno salarial para aqueles que apostam nos estudos superiores. Recorde-se, a este propósito, que a diferença remuneratória entre quem frequentou o ensino secundário e quem conquistou uma licenciatura caiu na última década. @ Expresso
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