O Conselho Nacional de Educação (CNE) debruçou-se sobre como deve ser a escola depois da pandemia e não tem dúvidas. “As decisões que se tomem neste momento no contexto da doença Covid-19 poderão ter consequências a longo prazo para os futuros da Educação”. A pandemia evidenciou desigualdades e vulnerabilidades, mas também revelou arte e engenho, dedicação e esforço da comunidade educativa a vários níveis. “Vive-se um momento em que são necessários pragmatismo e ações rápidas, mas em que, mais do que nunca, não se pode prescindir da reflexão partilhada”. É necessário atuar no imediato, programar a médio prazo, pensar a longo prazo.
O CNE avança com diversas recomendações, a vários níveis, sobre a escola no pós-pandemia depois de uma apurada reflexão em torno de desafios e estratégias. O ensino a distância veio destapar desigualdades e dificuldades no uso da tecnologia, na utilização de ferramentas digitais com que professores e alunos não estavam familiarizados. “Com a pandemia, as desigualdades dispararam: por falta de equipamentos que permitiam acompanhar as aulas por via remota, por falta de condições no acesso às redes móveis, por falta de apoios adequados a alunos, por desigualdades profundas entre as famílias, em diversos domínios, incluindo, também o da literacia digital”.
O órgão
consultivo do Ministério da Educação partilha estratégias e medidas para
reduzir, nas escolas, os impactos socioeducativos da pandemia e potenciar o
desenvolvimento e o progresso nas aprendizagens. As suas recomendações resultam
da análise de documentos e estudos internacionais e nacionais, da audição de
vários especialistas, da consulta de comissões especializadas. “As crianças e
os jovens foram atingidos no que de mais importante há para o seu
desenvolvimento, nomeadamente nas suas oportunidades de interação face a face
para a descoberta do conhecimento e com fins de socialização”, sustenta.
É
necessário encontrar respostas e reforçar recursos para superar dificuldades e
problemas indisfarçáveis que já existiam, ou seja, défices que a pandemia
agravou. O CNE recomenda atenção particular aos jovens professores que
completaram a sua formação inicial, no Ensino Superior, durante a crise
pandémica e que, por causa do confinamento, não fizeram formação prática em
contexto escolar. Nesse sentido, defende um período de práticas letivas e
escolares devidamente supervisionado. Uma recomendação que se aplica de igual
forma a todos os outros profissionais que podem vir a exercer funções nas
escolas e que, por terem concluído a sua formação inicial durante os meses da
pandemia, “não puderam desenvolver competências de aplicação direta dos
conhecimentos e de comunicação através do contacto presencial com crianças e
jovens em contextos escolares”.
Ouvir os alunos, gestão participada
O CNE recomenda ao Ministério da Educação, ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, e outras entidades governativas com influência nestas decisões, que os documentos curriculares em vigor sejam reavaliados e, se for caso, reformulados para “disponibilizar um referente curricular coerente, focado e flexível”. Além disso, sugere que se estude a reorganização do Ensino Secundário de forma a manter o 10.º ano “mais livre e transversal aos diferentes percursos de conclusão do ensino obrigatório, relegando para os 11.º e 12.º anos a escolha das vias de conclusão e acesso ao Ensino Superior”.
Na preparação do próximo ano letivo, e regresso às aulas em setembro, a principal preocupação, por parte das escolas, deve ser ouvir as crianças e jovens e identificar as condições psicoafetivas e de aprendizagem para atuar em duas frentes, ou seja, nas aprendizagens essenciais e estruturantes e no bem-estar emocional. Por outro lado, é preciso especial atenção aos alunos que irão frequentar o 3.º ano no ano letivo de 2021/2022, sobretudo quanto às aprendizagens relacionadas com literacia da leitura, escrita e oralidade, bem como aos alunos que estiveram afastados da escola na sua versão digital, e ainda aos que sofreram maior abandono ou dificuldades por diversos motivos.
Na gestão do currículo, o CNE recomenda a revisão das planificações de ensino, mais concretamente que sejam reelaboradas numa perspetiva de ciclo de escolaridade, e que se use a flexibilidade curricular para reforçar conhecimentos, capacidades e atitudes identificados como menos apreendidos e consolidados em anos letivos anteriores. E dar voz aos alunos é fundamental, procurar envolvê-los, desde o 1.º Ciclo, no planeamento do ano letivo, e negociar com as crianças e jovens os objetivos a cumprir, numa lógica de gestão participada e de fomento da cidadania.
Por outro lado, o CNE lembra que as desigualdades a que jovens de alguns municípios e regiões estão sujeitos, dado o reduzido leque de ofertas de vias de finalização do Ensino Secundário, não podem ser esquecidas. É necessário reforçar as equipas multidisciplinares com a contratação de técnicos especializados e de assistentes operacionais.
É importante valorizar a transdisciplinaridade na abordagem de conteúdos menos consolidados ou de matérias novas, de acordo com necessidades específicas identificadas em cada escola, envolvendo trabalho docente colaborativo e cooperativo. Esta é mais uma recomendação. Tal como relativizar o impacto do número de dias “perdidos” e valorizar, acima de tudo, a tranquilidade, a calma e o equilíbrio no regresso à escola, mantendo tanto quanto possível o tempo das interrupções letivas.
Outro ponto passa por potenciar as competências digitais adquiridas por professores e alunos. Consolidar a formação no uso educativo de ferramentas tecnológicas é essencial, tal como prever, no horário escolar dos docentes, tempo para trabalho colaborativo, flexibilidade para desempenhar diversas tarefas e créditos para formação. O CNE recomenda ligação de rede de internet robusta, rápida e eficaz e com equipamentos tecnológicos adequados em todas as escolas. E que se valorize a capacidade de trabalho colaborativo dentro das próprias escolas, em todos os níveis de responsabilidades e funções.
O CNE salienta ainda o reforço das equipas multidisciplinares, que
trabalham de forma permanente com um delimitado grupo de escolas ou
agrupamentos, com diversos profissionais especializados, de forma a desenvolver
um plano de promoção da saúde mental e física, do bem-estar sociofamiliar, e de
fomento do sucesso educativo e social de crianças e jovens. Para isso, é
necessário destacar a promoção de competências de gestão emocional e de
autorregulação em diferentes idades, bem como hábitos saudáveis e métodos de
organização e estudo.
As escolas não podem esquecer as famílias, devem intensificar e consolidar o contacto regular, fomentar reuniões, permitindo assim um acompanhamento mais sistemático do desempenho dos alunos. As famílias devem estar envolvidas nos planos de atividades e no projeto educativo da escola. Os estabelecimentos de ensino devem trabalhar em articulação com entidades da comunidade local e as autarquias devem fomentar a oferta de atividades lúdicas nas férias escolares, que englobem estratégias pedagógicas alicerçadas na cultura dos territórios onde se inserem. @ Educare.pt
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