quarta-feira, 24 de outubro de 2018

olhares sobre questões de Educação


Antes de flexibilizar o currículo, é preciso que nos flexibilizemos a nós…

daqui
Trabalhar no sentido do desenvolvimento das competências definidas no Perfil dos Alunos à Saída da Escolaridade Obrigatória pressupõe, a montante, que em cada um de nós aconteça uma mudança ideológica e paradigmática, sob o risco de qualquer mudança nas práticas parecer descontextualizada e desprovida de intencionalidade e sustentação. Como todos sabemos, a mudança não se faz por decreto, e é sempre mais profícua quando acontece de dentro para fora. Mudar nunca é fácil, porque as mudanças obrigam-nos ao confronto com as nossas fragilidades e incertezas. Muitas vezes é este medo do desconhecido que sustenta a tentação de continuarmos demasiado arreigados a modelos que, ainda que obsoletos e desajustados, nos mantêm numa zona de conforto de que não é fácil sair. Reconhecer a necessidade da mudança, querer a mudança e, sobretudo, acreditar que se faz parte da mudança, parecem-me ser as premissas de onde devemos partir. 
Os desafios que se nos colocam obrigam a um trabalho árduo de desconstrução e de (re)colocação em perspetiva da gramática organizacional que ainda impera nas nossas escolas. Em vez da especialização e da fragmentação de saberes, Edgar Morin propõe um dos conceitos que o tornaram um dos maiores intelectuais do nosso tempo: o da complexidade. O pensador critica o modelo ocidental de ensino que, segundo ele, separa os conhecimentos artificialmente através das disciplinas.
Apesar dos múltiplos constrangimentos, que são reais e não fruto da imaginação dos mais céticos, apesar das resistências que se adivinham - e já se sentem - ,as mudanças que por aí pairam,  mais do que “modinhas passageiras”, têm de ser percebidas como imperativos urgentes. A compartimentação e estandardização dos saberes tem de ser substituída por uma lógica interdisciplinar e transdisciplinar, o trabalho ainda muito isolado dos professores tem de ceder lugar às práticas cooperativas e colaborativas, e as metodologias e estratégias, ainda excessivamente uniformes e estandardizadas, têm de se tornar diversificadas, flexíveis e adequadas à heterogeneidade de alunos e alunas.
Não posso deixar de manifestar a minha concordância com a opinião de António Figueiredo, expressa no seu Blogue:“(…) não é fácil falar de competências num mundo onde toda a gente fala de conhecimentos, conteúdos e disciplinas. (…) É um pouco como tentar explicar que a Terra é redonda a uma multidão que tem a certeza absoluta de que ela é plana, ou afirmar que a Terra anda à volta do Sol perante uma população que acredita que é o Sol que anda à volta da Terra”. (https://medium.com/@adfig/que-competências-para-as-novas-gerações-ii-e000f41e16b2)
Como defende o mesmo autor, é chegada a hora de as nossas escolas privilegiarem as “pedagogias emancipatórias”, ao invés de fomentarem “pedagogias predominantemente explicativas”.
Difícil? Claro que sim. A mudança é um processo lento, nem sempre linear e, com certeza, não isento de incerteza, complexidade, imprevisibilidade e possibilidade de erros. Mas ´o caminho faz-se, caminhando`. E o caminho, seja ele qual for, deve ser partilhado e concertado por todos, e não resultado de iniciativas pontuais e individuais que, ainda que repletas de mérito, serão sempre desprovidas de um sentido coletivo que as efetivas mudanças sempre convocam.
E não, o “55” não é só o autocarro que nos leva do Bolhão até Baguim do Monte, colegas… Com o “55” que por aí circula, os destinos são múltiplos e ainda em aberto. Compete-nos a nós definir-lhe o rumo!
Ana Granja

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